quarta-feira, 26 de maio de 2010

CLICK

       Minha primeira máquina profissional, adquiri quando de passagem por Santa Cruz do Sul. Comprei na caixa, novinha. Belinha era seu nome.
       Passei dois meses inteiros viajando e só fotografando crianças. Queria mostrar a ela como o mundo é bonito. Tem coisa mais linda que um sorriso de bebê?
       Só depois, com o passar do tempo, comecei a fotografar outras coisas, trabalhadores, a arquitetura das cidades, paisagens, a fauna, as flores, mostrei a alegria do Carnaval da Bahia, o colorido nas Festas Juninas de Pernambuco, o Boi Bumbá no Maranhão, a vida cultural e deliciosa do Rio e de São Paulo, a confraternização das pessoas nas Rodas de Chimarrão no Rio Grande do Sul, a religiosidade no Sírio de Nazaré, em Belém do Pará e o Terno de Reis em Minas, enfim, sempre que fazia uma fotografia, quando escutava o "click", eu pensava no seu crescimento interior. O Brasil é um país riquíssimo.
       E tão amado!
       Só então, depois que ela tinha visto e aprendido bastante, expliquei que também existia outras coisas ainda mais importantes que ela precisava conhecer!

       Durante esses anos que tenho viajado pelo Brasil fotografando e escrevendo poemas, tenho escutado muito o meu coração. E também o coração do povo, particularmente, do povo mais humilde e especial.
       Visitei algumas escolas carentes para recitar poesia para os alunos, entrei em alguns hospitais psiquiátricos, de vez em quando um albergue para deficientes, e, sempre que enxergava um velho mendigo, na beira de uma estrada, estacionava meu carro no acostamento e descia para conversar. Na verdade, mais para escutar. Histórias de vida que faz você pensar. E repensar o mundo.
       Leio nos jornais sobre guerras, políticas criminosas e interesseiras, desigualdades, intrigas, violência, assassinatos... Vejo um mundo de pessoas presas em coisas absurdas, aprisionadas em celas construídas com as barras da arrogância, dos preconceitos, da ganância, da intolerância, do ciúmes e da mentira.
       Falta poesia no mundo. A boa poesia.

       Escrever e viajar, para mim, são atos de resistência, mas acima de tudo, de aprendizado, onde a maior lição, a lição da solidariedade, quem ensina são as pessoas simples, os desvalidos, os pobres e os excluídos desta nossa sociedade desigual e injusta. É junto deles que eu encontro a luminosidade e a nitidez perfeita para fotografar a generosidade e a aflição da alma humana.

       É um mundo delicado e sensível, onde a poesia tenta sobreviver no grito incompreensível dos loucos, mendigando no olhar perdido dos velhos esquecidos em asilos e em beiras de estradas, se humilhando na palavra de um menino de rua pedindo "por favor".

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